sexta-feira, 7 de maio de 2010

Preconceito

As tensões entre Protestantes e o Povo de Santo, no Brasil, vem crescendo nos últimos anos. É sobre esse conflito que se debruçam os especialistas, enquanto parecem ignorar a faceta mais perversa da questão.


No dia 21 de Abril de 2010, a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) promoveu o chamado “Dia D”, evento anual que congrega fiéis e simpatizantes em todo o Brasil. Segundo estimativas, três milhões de pessoas se reuniram no Rio de Janeiro, na enseada de Botafogo. O acontecimento—penso eu na minha inocência—merecia, por suas proporções, uma cobertura adequada por parte dos meios de comunicação.


O jornal O Globo exibiu, no dia seguinte, a seguinte manchete: “Caos no Rio de novo surpreende autoridades”. Logo abaixo, a foto de capa: uma fileira de ônibus parados no aterro do Flamengo. A reportagem anunciava: “ Duas semanas após o temporal que parou o RJ, a cidade viveu novo dia de caos(...)”. Abrindo o jornal, encontramos outra manchete: “ Caos Universal e autorizado”.

Nos dias seguintes, O Globo continuou a tratar do assunto, no mesmo tom. Na internet, centenas de mensagens indignadas de moradores da Zona Sul, esbravejando contra a manifestação religiosa.


Não se trata aqui de defender a IURD e as suas práticas. Eu, inclusive, repudio tal igreja pela sua inconsistência teológica e por partilhar da abominação que é a Teologia da Prosperidade. Mas devemos prezar pela honestidade intelectual.

Um telespectador, Ubiratan, falando ao vivo em um programa da Rede Record disse:

- Eles [O Globo] têm medo da força do povo evangélico.


Concordo integralmente com a opinião do rapaz. Engana-se quem acredita ser a perseguição das Organizações Globo contra a IURD mera disputa de mercado televisivo. Há algo maior em jogo. A questão gira em torno do preconceito da classe média—ávidos leitores do jornaleco—contra qualquer manifestação de religiosidade popular.

Podem tentar me refutar por meio de um exemplo: a cobertura positiva que as Organizações Marinho faz da festa de Iemanjá, na praia de Copacabana. Ou então, falarão da presença de temáticas afro-brasileiras nas novelas e minisséries globais.

Veremos, sem qualquer dificuldade, que as religiões de matriz africana, são sempre analisadas pelo viés do exótico, do folclórico, e assim, esvaziadas. Assimiladas pela cultura de massa, são trituradas até se tornarem uma sopa rala, perfeita para as gargantas sensíveis da classe média. Já não estamos mais falando de religião, mas de cultura popular—no mesmo patamar dos bailes funk, das escolas de samba—coisa que o povão gosta, vai entender.

Os evangélicos, menos propensos a essas apropriações mundanas, são diretamente taxados de ignorantes, terroristas radicais, ou então são apresentados como vítimas indefesas de pastores larápios, que surrupiam a décima parte de seu salário de fome [salário que a mesma classe média acha excessivo quando tem de pagar seus empregados].

Enquanto seguem divididos, crentes e macumbeiros ignoram que o inimigo é comum: o preconceito das velhas elites, e o medo que atravessa as estruturas de poder sempre que Deus vem, selvagem, dançando, ao som dos tambores, entre línguas de fogo, caminhar entre o povo.

6 comentários:

Unknown disse...

Bravo! Ótimo texto!

Alan disse...

Este, Bruno, é daqueles textos que gostaríamos de não precisar escrever...

Grande abraço!

Diego Moreira disse...

Excelente, caboclo! Saravá!

Alan disse...

Saravá, Diegão!

Orlando Rey disse...

Gostei muito da sua analise. Entretanto, só lamento que no projeto de poder dos neopentecostais, não espaço para outras manifestações religiosas!!!
Cordiais saudações!!!!
Orlando Rey

Alan disse...

Valeu, Orlando!
Abraço!