quarta-feira, 12 de maio de 2010

DNA, FEMINISMO E OS GAVIÃO-IKOLEN



Fiquei impressionadíssimo esses dias quando passei pela Avenida Brasil. O motivo: centenas de milhares de anúncios, multiplicados nos muros, postes e pontos de ônibus, ofereciam exames de DNA a preços populares. A rapaziada pode parcelar o troço em até 15 vezes, vejam vocês.


Aliás, esse negócio de exame de DNA tem provocado polêmica no mundo jurídico e alimentado matérias em revistas de celebridades. Eu, que nada entendo de leis, celebridades, e de código genético, só consigo lembrar os índios Gavião Ikolen.

Esses índios vivem, atualmente, na Área Indígena Lurdes, no Estado de Rondônia. Sua população gira em torno de 500 pessoas. Para eles, essa história de DNA não faz o menor sentido. Isso porque—eis a lógica cristalina!—uma criança pode ser filho de diversos pais.

Um filho é sempre produto de todas as relações sexuais que a mulher teve depois da última menstruação. Quando o moleque vai crescendo, a mãe vai logo ensinando, apontando o dedo para os quatro cantos da aldeia:

- Este é seu pai. Esse é seu pai. Aquele é seu pai...—E cada pai contribui um pouquinho: de um o rebento herda o nariz; do outro, a boca; de outro, as orelhas.


Além de um belo modelo de transmissão genética comunitário, nunca sequer imaginado por Platão, tenho cá pra mim que foram os Gavião-Ikolen que fizeram, de fato, triunfar a bandeira do feminismo, muito antes de Lily Braun, Betty Friedan e Marlene Mattos. Acompanhem-me.


Esses índios ensinam que ao abraçar uma moça é preciso ter muito cuidado: qualquer movimento mais afoito, mais brusco, é capaz de perturbar o seu ti, sua alma vital, a sua energia. Existe violência maior?

Quando os índios se casam, vão, na mesma noite, dormir na mesma rede. Mas isso não significa nada. É preciso deixar o amor crescer, explicam. O homem deve manter absoluto autocontrole, caso contrário será visto como uma criatura sem princípios, repudiado por toda a tribo. O casal dormirá abraçado todos os dias, até alinhar o ritmo de suas respirações. É preciso—ensinavam muito antes de Manuel Bandeira—deixar que os corpos se entendam.


Esse jogo pode durar meses, até anos. A mulher seguirá segredada até o dia em que sua alma, seu ti, não se deixar mais assustar. Porque, entre eles, a palavra final, a mão certeira, a recriação do mundo, depende unicamente da vontade dela.

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